O NOVO ENSINO MÉDIO:
SOBRE O NOTÓRIO SABER
A Medida Provisória 746 de 2016, a MP do Ensino Médio, vem sendo discutida aqui neste espaço. No mês passado procurei trazer a discussão para a questão da infraestrutura. Neste mês pretendo discutir um pouco sobre a polêmica do “Notório Saber”. Vamos explicar.
A Medida Provisória alterou (vai alterar se for aprovada) vários artigos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/1996). Uma dessas alterações se dá sobre o artigo 61, que trata do que se considera um “profissional da educação” acrescenta: IV – profissionais com Notório Saber reconhecido pelos respectivos sistemas de ensino para ministrar conteúdos de áreas afins à sua formação para atender o disposto no inciso V do caput do art. 36. O artigo 36 trata do Currículo do Ensino Médio, o inciso V trata do ensino técnico e profissional. Ou seja, de acordo com a MP o futuro professor do ensino técnico deverá demonstrar o “Notório Saber” sobre a área em que vai ministrar.
Sobre essa questão tenho acompanhado diversos debates. Uma dessas vertentes afirma que isso abriria um pressuposto para que diferentes profissionais pudessem ministrar disciplinas do currículo básico (Geografia, História, Filosofia, etc).
Ainda que a Medida Provisória não deixe isso claro, como pode ser lido na indicação acima, ela tem um fundamento de razão. O Senador Cristovam Buarque (PPS-DF) tem defendido a ideia de que profissionais aposentados de diferentes áreas (como engenheiros, por exemplo) possam dar aulas de matemática ou química, ou que um jornalista desempregado ou aposentado possa dar aula de Língua Portuguesa. Essas declarações você pode acompanhar neste link: https://goo.gl/6f4G1w.
O que talvez o senador tenha esquecido é que não basta para um professor saber seu conteúdo. Claramente que isso é importante, mas não só isso. Essa visão de que qualquer um pode ser um professor é uma visão antiga. Claramente uma visão liberal tradicional que entende que basta o adulto saber o conteúdo que ele pode transmiti-lo para qualquer criança.
Ainda que a tendência liberal tradicional tenha sido cunhada no decorrer dos séculos XVIII e XIX na Europa, essa concepção de que qualquer um poderia ser um professor, já havia sido combatida por Comênius nos idos de 1600. Comênius, o pai da didática, entendia que o professor deveria ter um método de trabalho e a descreve em seu livro Didactica Magna.
O Prof. José Carlos LIbâneo, no livro Didática, corrobora essa questão do método de trabalho do professor. O autor afirma que toda prática docente é intencional. Não basta apenas instruir. Instruir, para Libâneo, está subordinado ao ensino, já que esta é muito mais ampla do que aquela. Para ensinar é preciso desenvolver ações, meios e condições para a realização da instrução. Ainda que seja tentador tomar o rumo da conversa para se aprofundar na didática, deixarei essa questão de lado, já que o foco deste trabalho não é este. De qualquer forma, fica a indicação de leitura (inclusive aos que defendem o “notório saber”).
Voltando a discussão sobre os critérios de contratação de professores, ou dos profissionais da educação, como está na Medida Provisória, vamos aqui apresentar uma proposta, já que ela está ai e muito provavelmente será aprovada.
Não há dúvidas de que qualquer um que se queira prestar ao trabalho de professor deve possuir conhecimentos pedagógicos mínimos tais como: teorias do currículo, didática, avaliação escolar, teorias de aprendizagem, métodos e técnicas de ensino e vários outros conhecimentos que possui o pedagogo. Porém, se o candidato não pretende trabalhar com a educação infantil e com os anos finais do ensino fundamental, talvez não seja tão necessário que ele curse 3 ou 4 anos de pedagogia. Por isso, essa proposta é que os cursos de pedagogia possam adequar seus currículos para criar um curso de um ano ou um ano e meio para algum tipo de introdução à pedagogia.
O leitor mais conhecedor dirá que a Resolução 02/2015 do Conselho Nacional de Educação já prevê isso. Realmente este parecer oferece ao profissional formado em qualquer área, a possibilidade de se formar Pedagogo em apenas um ano e meio. Releia: formar um pedagogo em um ano e meio. O que isso significa? Que este profissional (por exemplo, um engenheiro elétrico), em um curso de um ano e meio poderá se tornar um professor alfabetizador.
Gostaria muito da sua atenção neste ponto. A formação do Pedagogo é algo amplo que pode tomar várias direções. O Pedagogo que fica 3 anos (no mínimo, passando para 4 anos em 2017 a partir da Resolução 02/2015) que será o alfabetizador, é o mesmo que será o diretor de escola. É o mesmo que será professor dos anos iniciais do ensino fundamental. É o mesmo que será alfabetizador de adultos. É o mesmo que será coordenador de escola. É o mesmo que será assessor pedagógico, e por ai vai.
Ora, se para formar um Pedagogo leva-se (a toque de caixa) pelo menos 3 anos, como que uma resolução permite que um profissional que tenha o Ensino Superior em qualquer área, se torne Pedagogo em apenas um ano e meio? Se assim é, gostaria eu de cursar Direito em um ano e meio! Ou Medicina, quem sabe! Ou Fisioterapia, Odontologia, Geologia ou qualquer outra profissão. Totalmente contraditório, não?
Pois bem, gostaria de deixar essa reflexão para você. Se já temos uma situação capenga na educação brasileira com a formação de professores em três anos. Imagina como se dará a contratação daqueles que deverão demostrar o “Notório Saber”?
Ivan Claudio Guedes, 36.
Geógrafo e Pedagogo
GUEDES, I.C. Novo Ensino Médio: Sobre o Notório Saber. Gazeta Valeparaibana [Online] São José dos Campos, 01 nov. 2016. E Agora José? Debatendo a educação. Disponível em http://gazetavaleparaibana.com/108.pdf Acesso em 04 nov. 2016.
Vem um caso de dualismo e discriminação com a licenciatura como algo inferior a outros cursos. Desse mesmo modo um enfermeiro muito experiente poderia ser médico! Um pedreiro poderia ser engenheiro (existem muitos pedreiros melhores)! Um professor de física poderia trabalhar como técnico em Raio X, como médico tirando ultrassonografia (a coisa mais simples do mundo) e ainda os médicos ERRAM o sexo! Reitero uma vergonha!
Sem dúvida. A licenciatura é uma área muito “perigosa”. Todo mundo quer meter a colher.
Um forte abraço
Em todas as profissões existem problemas e escassez mas somente na licenciatura querem aplicar essa reforma por ser o elo mais frágil.
Exatamente. Existe um monte de especialista em educação que não sabe o que é uma sala de aula.
Um forte abraço
para ensinar as vogais, semi vogais, alfabeto, tabuada, equação de primeiro grau etc basta ser graduado. Não precisa de um uma graduação especifica para ensinar estes itens básico. Sendo assim digo SIM a reforma
Desculpe… Mas acho que você não conhece o mínimo de educação e escola.