DE ESCOLA REPRODUTORA A ESCOLA TRANSFORMADORA
Apenas deter o certificado de pedagogia não garante o conhecimento
Escola reprodutora e escola transformadora, suas diferenças e seus desafios. A criação da escola no Brasil está ligada estritamente ao desembarque dos jesuítas para “catequizar e domesticar” os índios.
Em seguida, o sistema de ensino implantado tinha como objetivo atender aos anseios da nobreza instalada na colônia para que seus filhos fossem corretamente instruídos para voltarem ao velho continente e concluir o ensino superior.
Desta forma, por muito tempo nossa escola pública também foi elitista e considerada como uma arma importante para adentrar no mundo universitário. Bom, de lá para cá muita coisa mudou e a universalização do ensino tão pregada pelos escolanovistas, está se tornando uma realidade. Apesar dos tropeços e enganos cometidos, temos avançado nesse ideal de escola para todos.
Mas, porque não temos alcançado os louros da vitória tão desejados? O que estaria faltando para alçarmos voos mais altos em direção ao topo da lista das avaliações externas como, por exemplo, o PISA? Avançamos timidamente e às vezes recuamos nos índices e quase que invariavelmente o debate recai sobre os professores. Será que a culpa é só e tão somente dos professores? Que escola nós temos, ou seja, que tipo de escola nós temos? Quais os objetivos dessa escola?
Bem, a resposta, acreditamo-nos, é que a nossa escola calcada em valores elitistas e/ou tecnicistas não mudou em quase nada do que era, ou melhor, ela é ainda carrega a estrutura de uma escola tecnicista com ranços elitistas. Ou seja, ainda continuamos com um modelo de escola reprodutora.
A estrutura curricular verticalizada baseada na escola reprodutora de conteúdos inadequadamente agrupados, sem transversalidade e sem interdisciplinaridade está mais presente e vivo do que durante os anos 1960 e 1970. As disciplinas são desligadas e desconexas da realidade, recheadas de conteúdos estanques. Nada (ou muito pouco, para não generalizar) aplicáveis ao nosso mundo. Então qual a diferença entre a tradicional (escola reprodutora) e a atual?
O século XXI iniciou-se com mudanças bruscas nos paradigmas sociais, estamos diante de uma nova realidade, novos interesses, novos objetivos. O lado negativo é que ainda estruturamos a escola com base em critérios da segunda metade do século XX (que é uma caricatura da estrutura europeia do século XIX).
Temos uma escola “para todos” com valores elitistas. Agregado a isso se soma o Estado lento e burocrático que não sabe se assume uma postura neoliberal ou de bem-estar social. Um Estado que funciona no papel, mas que não se aplica à realidade, ou seja, temos um Estado de “faz de conta” que proporciona uma educação “faz de conta”.
E porque chegamos a esse ponto? Primeiro por que não produzimos nenhum sistema educacional estritamente nacional voltado às nossas realidades. Segundo, a ingerência de partidos políticos na educação tem sido uma constante. Uma vez que a cada eleição, as mudanças de secretários, de ministros e agregados políticos resultam em uma reformulação do que estava sendo feito, partindo do zero. Os debates sobre a educação têm sempre o mesmo discurso e a mesma receita. Na prática, o resultado é sempre o mesmo: A má qualidade da educação.
Até agora ninguém, de qualquer partido político, teve a sensatez de dizer que educação deveria ser apartidária, traçada em longo prazo, mas com critérios objetivos e bem definidos, visto tratar-se de um bem maior do que as mesquinhas políticas partidárias.
Em terceiro lugar, podemos dizer que gostamos de importar “modismos pedagógicos” e modelos do hemisfério norte. Dentre os modelos importados, só não importamos orientais até agora por que, a bem da verdade, veem mostrando bons resultados, mas requerem uma mudança de postura social e, principalmente, política (sobretudo no campo da ética).
Nessa imensa colcha de retalhos que é o nosso sistema educacional, podemos apontar os temas transversais. Na Espanha, por exemplo, tem apresentado bons resultados e poderiam ser melhores trabalhados por aqui. Porém, no Brasil, não passa de um empilhado de temas e ideias que quase não estão presentes em livros didáticos ou em estruturas curriculares elaborados pelos sistemas de ensino.
O trabalho interdisciplinar, na prática, fica a cargo do professor que se aventura em desenvolver projetos. Diga-se de passagem, à parte do menu acadêmico. Coordenadores pedagógicos ficam torcendo para que apareça um grupo de professores dispostos a introduzir os temas transversais e ligar suas disciplinas num âmbito interdisciplinar e com isso dar sentido às suas aulas.
As universidades, por sua vez, limitam-se ao conteúdo curricular ensinado às várias gerações. Não há mobilidade curricular. Professores são engessados dentro de uma “caverna”. Esses profissionais são jogados no mercado profissional e levam consigo a sua “caverna”. Repassam aos seus alunos as mesmas sombras que um dia aprenderam a acreditar.
Kant em sua pedagogia de valores morais, assim como outros, como, por exemplo, Paulo Freire e Rubem Alves, nos convidam a olhar com outros olhos, a termos um olhar quase metafísico em que o ser é muito mais importante. O ser humano está em constante evolução e, portanto o ensino deveria acompanhar essa evolução. O que se vê nas escolas é a transmissão de ideias arcaicas a respeito das ciências. Uma ciência imutável? As teorias científicas se sucedem ao longo do tempo e, em tom jocoso podemos dizer que nada é absoluto e tudo é relativo. Essas mudanças profundas ou não, e que podem ser de natureza epistemológicas, refletem diretamente na educação.
Diante desses fatos porque não se fazer uma integração de saberes? O ensino das disciplinas curriculares está enclausurado em gaiolas como pássaros que já não alçam voo. Precisamos de uma força transformadora que faça com que o dia a dia esteja presente no ensino dessas matérias curriculares. Evidentemente, não podemos relegar a desprezo o ensino tradicional. Não se trata de abandonar um e acolher o outro, mas de integração, união, ou seja, de desconstruir a escola reprodutora para reconstruir uma escola transformadora.
Nada melhor para transformar do que miscigenação dos conhecimentos, dos saberes. Os temas transversais e a interdisciplinaridade tem o papel importante de ser o agente aglutinante que irá dar vida nova ao conteúdo curricular. Bem como despertar no aluno a necessidade de se tornar um ser humano melhor. Um ensino integrado pode despertar no horizonte. Mas é preciso ter cautela! Pois uma simples canetada juntando disciplinas e mudando a estrutura curricular de uma hora para outra (como já desponta o MEC), pode piorar o que já está ruim.
Omar de Camargo
Técnico Químico
Professor em Química
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Ivan Claudio Guedes
Geógrafo e Pedagogo
[email protected]
CAMARGO, O.; GUEDES, I.C. De escola reprodutora a escola transformadora. Gazeta Valeparaibana [online], São José dos Campos, 01 ago. 2014. E Agora José? – Opinião. Disponível em http://www.gazetavaleparaibana.com/081.pdf Acesso em 02 ago. 2014.
Professor Ivan,
John Locke é então um dos pensadores da Tendência liberal tradicional certo? (Vi no seu vídeo sobre Tendência Liberal Tradicional) Eu gostaria de saber se tem mais algum pensador importante dessa tendência? Quando pesquisamos as outras tendências, sempre vemos os nomes dos pensadores (Piaget, Vigotsky, Montessori…..
Exato, ele é o “pai” de tudo. Mas, se quiser ir um pouco mais a fundo na história, leia a Didática Magna de Comêmius. Vai ajudar Bastante. Na sequência, entre os liberais, você pode consultar Bobbit, Rousseau e Condorcet. Isso vai te dar uma ótima base.